“Dá licença: sou pai!”

No momento em que ia ser apreciada a emenda que incluiu a previsão de licença-paternidade na Constituição Federal de 1988, o presidente da constituinte, Ulysses Guimarães, citou o humorista Chico Anysio, afirmando que “O dia dos pais era nove meses antes”. Ridicularizado, o autor da emenda subiu na tribuna para defender o direito à licença-paternidade em meio aos risos dos colegas constituintes. Como se essa lamentável cena não pudesse piorar, como se um só preconceito não fosse o suficiente para a ocasião, a proposta de criar uma licença-paternidade foi imediatamente apelidada pelos constituintes de “coisa de índio que não quer trabalhar”. Os estereótipos tentavam evitar o enfrentamento da questão que, passadas mais de três décadas, ainda não foi resolvi da: o homem brasileiro vai ou não participar dos cuidados dos filhos?

 

“Foi enquanto eu trocava as fraldas da minha segunda filha em cima de uma mesa na praça de alimentação de um shopping center que minha filha mais velha perguntou: “Por que você não troca a fralda no trocador de fraldas do banheiro masculino, papai?”. Era 2006, e minha resposta foi imediata: “Não existem trocadores de fraldas nos banheiros masculinos”. Na época com onze anos, a mais velha indignou-se: “Mas isso é machismo, papai”. A passagem jamais saiu da minha lembrança, pois foi a primeira vez que percebi machismos invisíveis para mim, mas evidentes para uma menina de onze anos de idade. Um pai de menina, ao longo da sua paternidade, percebe, muitas vezes pela primeira vez, que os papéis de homens e mulheres na sociedade são ainda bastante reduzidos ao clichê “pai provedor, mãe cuidadora”. Ao desafiar esses papéis, homens e mulheres terão dificuldades. Homens cuidadores serão constantemente questionados a respeito da sua capacidade, quando não da sua importância na criação dos filhos. Mulheres provedoras terão desafios ainda maiores: preconceito no ambiente de trabalho, assédios, salários menores, posições hierárquicas inferiores, além de uma dupla jornada de trabalho, já que ainda fazem a maioria dos serviços domésticos. Impactado pela perspectiva de ver minhas filhas passarem por esses monumentais desafios, passei a pesquisar caminhos para maior equidade de gênero.”

Prefácio de Marcos Piangers

 

É função do Estado arquitetar uma política
pública de envolvimento paterno em busca de
isonomia de gênero?
Tentando trazer luz ao tema, Odilon Schwerz
Burtet, apoiado pelo Instituto Promundo, pesqui-
sou os desenhos das licenças em decorrência da
maternidade/paternidade no Brasil e no mundo.
Em Dá licença: sou pai!, o autor lança um olhar
atento à forma como os diferentes tipos de ar-
quitetura dessas políticas impactam pais, mães
e bebês, transformando ou mantendo a cultura
do pai como um mero ajudante nos cuidados
com os filhos.