1) Fale brevemente sobre sua formação e principais aspectos de sua trajetória profissional até chegar à Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente.
Sou professora, trabalhei por mais de 20 anos na rede publica, graduei-me em Serviço Social pela Universidade Federal Fluminense e como Assistente Social tive a oportunidade de trabalhar nas áreas de saúde, educação, justiça e assistência tanto na rede pública como privada – sempre no campo da infância e adolescência. Para qualificar essa prática especializei-me em direito especial da criança e do adolescente pela UERJ, em violência intrafamilair pela USP, e em responsabilidade social e terceiro setor pela UFRJ e, por fim conclui o mestrado em bens culturais e projetos sociais pelo CPDOC da FGV – RJ. Implantei o projeto inicial e dirigi a Fundação Xuxa Meneghel nos últimos 20 anos, acumulando desde 2002 a diretoria de responsabilidade social do Grupo Xuxa. Nesse percurso, participei do movimento social da área da infância e nos últimos dez anos integrei redes de proteção e promoção dos direitos da infância, entre elas a Rede Não Bata Eduque – da qual compartilhei a secretaria executiva com o Promundo. Em 2012 recebi o convite da Ministra Maria do Rosário – que conheci no parlamento quando ainda era Deputada Federal em trabalhos de incidência política – para ocupar a Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente.
2) Como está a situação da exploração sexual no Brasil? Fale sobre a situação no Brasil?
O enfrentamento da violência sexual no Brasil tem como marcos divisores a Constituição Federal (1988), o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) e, especialmente o Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes (2000), que demarcaram claramente que a sociedade brasileira não poderia mais continuar convivendo com a violência sexual contra crianças e adolescentes.
A legislação tem desafiado o estado brasileiro, a partir da construção de políticas públicas: de saúde, de educação, de assistência social, de turismo e de trabalho à enfrentar a violência sexual e garantir a proteção dos direitos de crianças e adolescentes.
Entendendo que o enfrentamento da violência sexual é uma responsabilidade de toda sociedade brasileira e é, fundamentalmente, uma violação dos direitos humanos, a Secretaria de Direitos Humanos, os Ministérios, os Organismos Internacionais e a Sociedade Civil Organizada vem desenvolvendo campanhas educativas permanentes de estimulo a denúncia, especialmente com a consolidação do Disque 100. E os números mostram que temos sido bem sucedidos nessas campanhas de conscientização.
Em relação a exploração sexual, que é um tipo de violência sexual, o governo brasileiro, também em parceria com as instituições de pesquisa, os organismos internacionais e as organizações da sociedade civil vem fazendo um esforço para mapear os pontos mais vulneráveis e críticos, para ter o perfil das crianças e adolescentes envolvidos com esta modalidade de violência, para compreender e (des)construir os fatores responsáveis pela sua ocorrência e, especialmente garantir que a exploração sexual não continue ocorrendo.
O último levantamento da Polícia Rodoviária Federal (PRF), realizada em 2011, encontrou mais de 1800 pontos vulneráveis e críticos para exploração sexual de crianças e adolescentes nas rodovias federais. A Matriz Intersetorial de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes, realizada em parceria com a Universidade de Brasília, mapeou as cidades brasileiras com ocorrência de exploração sexual, bem como os programas, serviços e ações para atendimento das vitimas que já existem. Temos que continuar aperfeiçoando as pesquisas e estudos sobre a questão, bem como ampliarmos as campanhas educativas que envolvam toda sociedade, como primeira etapa do enfrentamento da questão: que é a denúncia.O Brasil tem realizado progressos significativos no enfrentamento da exploração sexual, mas temos que continuar avançando rapidamente na consolidação de nossa legislação, na estruturação de políticas públicas garantidoras de direitos e na superação deste fenômeno de dimensões social, cultural e histórico.
3) O Promundo está articulando uma campanha voltada para a Prevenção de Exploração Sexual de Crianças e Adolescente em função dos mega eventos esportivos focada nos fãs do futebol. -O que podemos fazer para prevenir a ES no contexto da Copa? Quais são os principais desafios e as oportunidades para prevenção frente a Copa?
Continuar agendando o tema e, especialmente informando sobre os direitos de crianças e adolescentes; divulgar o que a legislação brasileira indica nestes casos; informar sobre os canais de denúncia locais e nacional; contribuir na constituição de canais de comunicação diretamente com crianças e adolescentes; e, especialmente integrar a Campanha Permanente de Proteção Integral dos Direitos de Crianças e de Adolescentes, e os Comitês de proteção que estão se constituindo nas cidades que abrigarão esses eventos.
Quanto aos principais desafios entendemos que, talvez, o maior desafio seja de articular as ações de prevenção e enfrentamento da exploração sexual, tanto governamentais (União, Estados e Municípios), do sistema de justiça, e conselhos de direitos e tutelares quanto da sociedade civil organizada, dos organismos internacionais e do setor corporativo no contexto dos mega eventos. Este grande e necessário esforço está sendo conduzido pela SDH, em parceria com a construção de uma Agenda de Convergência objetivando a proteção e garantia dos direitos de crianças e adolescentes no contexto dos mega eventos.
Em relação às oportunidades, os mega eventos esportivos que serão realizados no Brasil nos próximos anos (Copa das Confederações, Copa do Mundo, Olimpíadas e Paraolimpíadas), poderão contribuir para fortalecermos o Sistema de Garantia de Direitos, para sinalizarmos para o mundo os avanços que temos obtido na proteção das crianças e adolescentes, para integrarmos efetivamente as ações de enfrentamento da violência sexual, e de todas as demais violações e, principalmente mobilizarmos a sociedade brasileira neste grande desafio de garantir direitos e proteger crianças e adolescentes de toda e qualquer violação dos seus direitos humanos.
4) O que podem fazer os fãs de futebol para evitar a ES contra crianças e adolescentes?
Primeiramente se incomodar profundamente com a ES. Entendendo que é uma violação dos direitos das crianças e adolescentes e, assim encaminhar as denúncias para as autoridades competentes (Conselho Tutelar, Polícia Militar, Ministério Público), ou para os disques denúncias locais e nacional (Disque 100).Participar ativamente de campanhas, eventos e mobilizações sociais de enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes.Ou seja, vou usar o slogan da nossa campanha: “Não desvie o olhar! – Preste atenção! Fique atento! Denuncie! Disque 100 ou procure o Conselho Tutelar”.
5) Na pesquisa inédita realizada por Promundo que será lançada no dia 18 de maio, um dos resultados apontam que 18% dos 662 entrevistados revelou ter se relacionado com menores de 18 anos. Muitos desses homens relataram existir relação afetiva com a jovem. Como abordar esse tipo de exploração sexual em políticas públicas?
As políticas públicas, especialmente aquelas relacionadas com a prevenção e o atendimento, devem buscar o empoderamento das crianças e dos adolescentes para que tenham instrumentos para se defenderem nestas situações. Deixando claro que o fato de existir uma “relação afetiva”, o que é extremamente questionável, não deixa de caracterizar um crime sexual previsto em nossa legislação. Temos que discutir qual é a possibilidade de uma criança ou adolescente dar um consentimento para estes relacionamentos. Os adultos são responsáveis em garantir os direitos de crianças e adolescentes e colocá-las a salvo de toda e qualquer violência, inclusive a sexual. O limite para o relacionamento afetivo e sexual tem que ser dado pelos adultos e não pelas crianças e adolescentes.
6) Qual a mais importante violação de direitos de crianças e adolescentes que a Secretaria vem enfrentando ou deve enfrentar?
A SDH entende que não existe uma violação dos direitos de crianças e de adolescentes que se sobreponha a outra. Todas são igualmente violações dos direitos humanos de crianças e adolescentes. Seja: a violência sexual, o trabalho infantil, a não garantia do direito a convivência familiar e comunitária, as condições em que estão sendo implementadas as medidas socioeducativas de adolescentes em conflito com a lei, o extermínio de crianças e adolescentes. Todas precisam ser igualmente enfrentadas e superadas.
7) Quais ações previstas para o 18 de maio, Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes?
As ações do 18 de maio são totalmente descentralizadas. Possivelmente, mais de 3.000 municípios brasileiros realização atividades relacionadas ao 18 de maio. Normalmente as atividades consistem em seminários, ciclos de debate, caminhadas, passeatas, atividades culturais envolvendo crianças e adolescentes, audiências públicas, blitz em rodovias federais e estaduais, campanhas educativas nas diversas mídias, etc.
A SDH em conjunto com o Comitê Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual, a Comissão Intersetorial de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes que reúne os ministérios, as secretarias, os organismos internacionais, a Frente Parlamentar da criança e do adolescente e a Caravana Siga Bem Caminhoneiro, estão organizando, para o dia 15 de maio, uma Audiência Pública no Congresso Nacional, a premiação da 3ª Edição do Prêmio Neide Castanha e uma Manifestação Cultural na Esplanada dos Ministérios em Brasília – DF. Será um evento político e cultural para mobilizar todos no enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes.
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